terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Mafalaia vs. Maria Gabriela: A Ideologia em um "Brasil Evangélico"

A entrevista do Silas Malafaia no programa da Marília Gabriela foi muito ruim. Apenas isso.

(reprodução da internet)Desde o início, apenas pela chamada do SBT que circulou na internet, já se percebia claramente o objetivo era a ~polêmica~ que o debate ia trazer. Malafaia é um pastor de "peso" - seja lá o que isso signifique - no cenário evangélico do Brasil, bem como na esfera política e até cultural. Ele é um dos símbolos do que vem se chamando de "brasil evangélico", ou seja, a descoberta recente da relevância dos que tem a fé evangélica em nossa sociedade - descoberta essa mediada pela grande mídia e, principalmente, pelo consumo deste grupo. Tanto essa descoberta é clara, que a própria Marília tem entrevistado alguns desses "grandes nomes" entre os evangélicos, como a cantora Aline Barros, a pastora e conferencista Sarah Sheeva e o próprio Silas Malafaia, entrevistado no último domingo

Mas vamos à análise da entrevista em si: De início preciso dizer que gosto e não gosto da Marília Gabriela como entrevistadora. Acho que ela costuma deixar muito clara sua postura diante dos assuntos, o que é positivo diante da pretensa "imparcialidade" que muitos assumem, que naturaliza ainda mais ideologias conservadoras que já fazem parte do senso comum. Mas, discordo de quando ela toma para si uma postura calcada nesse próprio senso comum - como pode se verificar, especialmente, em suas entrevistas com evangélicos. Clichês de "igreja rouba", "religião aliena", "ignorantes são vitimas dos pastores que só querem dinheiro" estão em maior ou menor grau sempre presentes na fala dela. E eu vi isso o tempo inteiro nessa entrevista. Apesar de comum no mal jornalismo brasileiro, chegar cheia de pressupostos calcados em preconceitos e generalizações é sempre algo negativo. Menos um ponto pra Marília.

Silas não acrescentou em nada pra quem já conhece seu discurso de sempre. Defendeu essa tal "prosperidade" que ele diz não ser financeira, mas sim qualidade de vida, e outras coisas ai. Algo como, "quem tem pouco sendo feliz com isso e quem tem muito sendo também feliz com isso". Mas na prática, o que se vê em seu programa não é bem isso, como se pode ver nesse vídeo que, ainda que com limites, aponta incoerências no discurso do pastor. Malafaia também demonstrou, como sempre, uma certa arrogância, ao mostrar que vem de família tal, fez teologia e psicologia,  bem como quando fica tentando dar valor de ciência à sua fala quando "antropologica, sociologica, psicologicamente" fica afirmando coisas. Sem contar que ele não demonstra a mínima preocupação com o nome de Cristo, sua Igreja e seu Evangelho terem sido sujos com a  repercussão da matéria da Forbes. Só demonstra preocupação com seus fiéis e sua fonte de renda. Menos muitos pontos pro Silas.

Sinceramente, acho muito irresponsável a forma como o Silas trata as coisas. Assim como a Marília. A questão está além do Silas dizer que a prosperidade que ele prega é diferente das outras. A questão é perceber que a lógica que transforma a fé em um produto, em um serviço, está presente até nessa diferenciação! "Não, porque a minha prosperidade é diferente da desonesta que pregam por ai" Claro, porque teologias e igrejas são como xampus dispostos na prateleira, onde fiés-consumidores escolham a que lhes convém, né? Quando ele compara pastores ricos como ele a jogadores de futebol milionários, isso só confirma que seu discurso está totalmente embebido de uma ideologia de mercado.

Tudo é questão de ideologia. Escolher dizer "homossexualismo" é se associar àqueles que dão à condição homoafetiva um status de opção, comportamento, e até de algo passível de ser mudado (incluindo ai os que acham que é doença). Dizer "homossexualidade", é dar status de identidade, de algo muito mais complexo e talvez até inerente ao indivíduo. Isso são opções ideológicas. Falar de prosperidade é se alinhar à uma ideologia que não tem nada de bíblica - assim como este juízo é, também, de acordo com uma ideologia. Perguntar se Igreja é "um bom negócio" é colaborar com a lógica capitalista que invade as mais diferentes esferas da nossa vida. A diferença é que eu estou aqui dizendo que defendo uma ideologia, sem medo de soar parcial, porque sei que realmente sou e todo mundo é. 

Infelizmente, muitos são os que travestem sua interpretação da Bíblia de "Palavra de Deus". Travestem seu ódio de "verdade bíblica", sob o pretexto de que "Deus é amor, mas também é justiça" - como se a justiça de Deus excluísse seu Amor. Outros, travestem sua defesa de uma certa laicidade e cientificismo barato em um descrédito a qualquer conhecimento que não seja "científico", "acadêmico" e principalmente, que seja fruto da experiência transcendental da fé. Defendem a superação de preconceitos, mas repetem o senso comum de que "religião aliena", como se não existissem religiosos pensantes. Resumindo: em ambos os lados, se é que pode se dizer assim, existe um mal uso da ideologia.

Nessa entrevista só pude perceber o mal que uma dada ideologia desumanizadora não-confessada traz. Ao naturalizar o que é desumano, bem como uma concepção barata de religião e espiritualidade, assim como confirmar o já cristalizado senso-comum, a entrevista somente "choveu no molhado". Quem concorda com as palavras do Silas, continua concordando. Quem vê a nós, cristãos/evangélicos, como ignorantes intolerantes, continua com essa visão. Terminou no zero a zero

Talvez, quem tenha saído perdendo, foi justamente o Evangelho, a Boa Notícia, porque de "boa" a notícia não teve nada.

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Outras reflexões (com concordâncias e discordâncias):
"Sabe a entrevista do Malafaia? Então..." pela e vlogueira Nil Moretto jornalista

"Como poderia ter sido o Malafaia na Gabi", por Vinícius Morais no blog "Refletindo a Graça"
"Silas Malafaia não é a imagem de Deus", pelo professor e pastor luterano Mozart Noronha, em sua página no facebook.
"Silas Malafaia: o Macunaíma evangélico", por José Barbosa Júnior no blog "Crer e Pensar"
"A religião não pode estar a serviço da intolerância", por Felipe Chagas no site do coletivo político "Juntos"

9 comentários:

  1. Fantástico !!! Concordo com cada linha !

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  2. Exclusivamente sobre o Silas Malafaia:

    Olha, eu, pessoalmente, não acho que o Silas defenda algo bom. Mas, sinceramente, essa é apenas a minha opinião. E digo isso porque nada do que eu creio ser essencial no evangelho é um dos "focos" da palavra dele.

    A perseguição à Igreja é certa. Se a Igreja de Cristo não for um "incômodo" em meio a um mundo corrompido pelo pecado, acho que ela está vazia de sentido. Mas o incômodo, e a polêmica no caso, não são o objetivo por si só. Ela deve ser consequência de uma atitude que subverte a lógica do mundo.

    Ser subversivo à ordem pecaminosa do mundo não é dizer que gays vão pro inferno. É distribuir seus 300 milhões, ou ~apenas~ 4,5 milhões, aos que realmente necessitam e sobreviver daquilo que Deus der (e não ficar usando o fato de se sustentar de doações como algo que se deva orgulhar). Não é pregar que Deus quer que seus filhos sejam prósperos, mas mostrar que, apesar da realidade desigual e extremamente afetada pelo pecado, há esperança - e esperança que nos é dada de graça, sem custos, sem valor fixo de oferta, sem meta de conversões ou sem ritual de levantar as mãos, declarar palavras x ou y e ouvir tal sequência de acordes. Ser subversivo nos dias de hoje é, enquanto o mundo inteiro te ataca acusando de ladrão, impostor e agitador político, você responder com amor, mansidão, serenidade. Sabe, algo mais parecido com um preso político de nome Jesus que morreu há uns 200 anos atrás numa cruz. A loucura tem que estar ai, temos que ser perseguidos justamente por isso! Pelo amor que parece loucura, coisa de outro mundo - até porque é.

    Em resumo, é o que eu já falei uma vez antes em outra discussão: Não existe, numa perspectiva centrada no exemplo de Jesus Cristo, uma voz que fale da Verdade sem Amor. Porque o Amor está no centro da Verdade. A Verdade é o Amor. Não o amor que a gente conhece, mas o que Jesus materializou em si. Isso transcende as nossas compreensões.

    Ou seja, se alguém, com a pretensão de "falar a Verdade", semeia o ódio, está fazendo algo de errado. Deus não precisa de quem o defenda, ainda mais uma defesa torta como a do Silas Malafaia.

    Mas isso é só a minha opinião.

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  3. Discodo em certos pontos, mas concordo principalmente na parte da prosperidade e quando vc disse que não acrescentou. Acredito que só tenha gerado uma certa rivalidade, até pq o Silas e a Gabriela estão bem um com o outro, mas não sei se posso dizer o mesmo dos telespetadores.

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  4. Olá,

    Puxa, obrigado por citar minha reflexão no seu excelente artigo!

    Um abraço!

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    1. Tamo junto cara, achei tua reflexão muito interessante! Precisamos de representantes muito mais próximos desse teu exemplo do que temos visto por ai, infelizmente.

      Vamos seguir trocando ideia aqui e no facebook, forte abraço!

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  5. basicamente, concordo com tdo que vc disse, e eu dizer que concordo é um puta elogio! não pq minha opinião é o máximo, mas pq eu gosto de polemizar, e se não tenho como/não consigo, parabens pra vc! hehehe!

    concordo 1000% com a avaliação de que geral saiu no zero a zero, quem ouve o cara continua ouvindo, quem odeia evangelicos continua odiando! e vou roubar seu conceito de "subversivo"

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